Uma em cada cinco normas federais criadas são da área tributária

Fonte: Folha de S.Paulo
21/10/2020
Imposto e Tributos

Praticamente 1 em cada 5 normas federais surgidas desde a Constituição de 1988 teve como tema a área tributária. A tributação respondeu por 15% das emendas constitucionais, 19% das leis ordinárias e complementares e 27% das medidas provisórias.

Os dados fazem parte do estudo “Quantidade de Normas Editadas no Brasil: 32 anos da Constituição Federal de 1988”, feito pelo IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação). Em média, foram editadas cerca de 20 normas por dia útil nesses 32 anos, sendo 4 da área tributária.

Em uma comparação internacional, considerando apenas os últimos cinco anos, o Brasil editou 13.182 normas tributárias, mais que o triplo do segundo e terceiro colocados entre os países avaliados, a Itália e o Chile, cada um com cerca de 4.000 normas no período.

Algumas delas criaram impostos e contribuições extintos (CPMF) ou que ainda estão em vigor, como a CSLL (Contribuição Social sobre o Lucro Líquido) e a Cofins, um dos alvos da reforma tributária do governo federal.

Se forem consideradas também as normas editadas por estados e municípios, que têm competência tributária mais restrita, 6,5% se referem ao tema. Em média, foi editada 1,5 norma por hora em todas as esferas de governo.

Das 419.387 normas tributárias editadas nesses 32 anos, 6,82%, ou 28.602, estavam em vigor em 28 de setembro de 2020. Se forem consideradas também as normas sobre outros temas (cerca de 6,5 milhões), o percentual de “sobrevivência” é de 13%, quase o dobro.

Segundo o IBPT, para conhecer todo o sistema tributário nacional em vigor, seria necessário ler 327 mil artigos, com 763 mil parágrafos, 2,4 milhões de incisos e 321 mil alíneas. Como a maioria das empresas não realiza negócios em todos os estados brasileiros, a estimativa de normas que cada uma deve seguir é de 4.377.

“Isto corresponde a 6,4 quilômetros de normas, se impressas em papel formato A4 e letra tipo Arial 12. Em decorrência desta quantidade de normas, as empresas gastam cerca de R$ 162 bilhões por ano para manter pessoal, sistemas e equipamentos no acompanhamento das modificações da legislação”, diz o estudo.

Para se manter atualizado sobre o tema, e também evitar autuações por parte das administrações tributárias, é necessária a ajuda de softwares robôs, como os que contribuíram para o levantamento do IBPT, além da alocação maior de pessoal e tempo com o tema.

O advogado tributarista e coordenador de estudos do IBPT, Gilberto Luiz do Amaral, afirma que o Brasil possui um grande número de tributos e obrigações acessórias ao recolhimento deles, o que demanda uma quantidade grande de normas para regular todo esse sistema.

“Para que as empresas consigam estar em dia com o Fisco, precisam ter um arsenal de pessoas, softwares e equipamentos para acompanhar tudo isso. Enquanto outros países apresentam uma obrigação acessória por ano ou semestrais, aqui são várias por mês, com uma complexidade enorme”, afirma.

De acordo com o relatório anual “Doing Business”, do Banco Mundial, o Brasil é recordista entre os países em que as empresas gastam mais horas com para fazer o pagamento de tributos, com mais de dois meses (62,5 dias ou 1.501 horas) por ano, entre 190 nações, quase 50% a mais que o segundo colocado, a Bolívia.

Na América Latina e Caribe, o período destinado para fazer o pagamento dos tributos é de 317 horas por ano, ou 21% das horas reservadas por empresários no Brasil.

Segundo Amaral, o Brasil também tem por tradição normas tributárias com problemas de redação e a falta de uma compilação que permita reunir a legislação sobre um tema em poucos documentos.

“Em países desenvolvidos, quando uma norma é modificada, ela é compilada, agrupada de maneira que se consiga se verificar o que está em vigor no seu conjunto. Aqui não, elas são esparsas. Pode haver mudança de tributo em lei que trate de outro assunto, os famosos contrabandos”, afirma.

“Se são editadas muitas normas por ano, se elas são de péssima qualidade e não há compilação, contribui para gerar muito contencioso.”

Sobre a reforma tributária, ele afirma que o período de transição para a adoção de um novo tributo sobre o consumo, como proposto pela Câmara e pelo Senado, tende a acelerar a edição de normas e aumentar a complexidade do sistema durante um período que pode chegar a dez anos.

“Você terá de fazer legislações para prever os novos tributos e para falar do sistema que ainda estará em vigor e perderá vigência dentro de alguns anos. As propostas que estão no Congresso não garantem uma simplificação da legislação. Nosso temor é que até aumente a quantidade de normas e, pela falta de qualidade das nossas legislações, isso vá ensejar mais discussões”, afirma.

O estudo tem como autores os advogados tributaristas Gilberto Luiz do Amaral, João Eloi Olenike, Letícia M. Fernandes do Amaral, Cristiano Lisboa Yazbek e Fernando Steinbruch, todos do IBPT.

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