O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, por maioria, que a demanda de energia elétrica contratada e não utilizada não deve ser incluída na base de cálculo do ICMS. O plenário negou recurso do estado de Santa Catarina e deu ganho de causa para os contribuintes, um entendimento que já vinha sendo adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral, que deverá ser seguida por todo o Judiciário do país: “a demanda de potência elétrica não é passível, por si só, de tributação via ICMS, porquanto somente integram a base de cálculo desse imposto os valores referentes àquelas operações em que haja efetivo consumo de energia elétrica pelo consumidor”.
O caso, que chegou à Corte em 2008, foi finalizado por meio do plenário virtual. O tema é discutido no Recurso Extraordinário (RE) 593.824, por meio do qual o estado de Santa Catarina recorreu de acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que determinou que a empresa Madri Comércio de Compensados e Laminados LTDA não pagasse o ICMS sobre a demanda contratada e não utilizada.
O estado alegou que o ICMS deve incidir sobre a tarifa cobrada do consumidor, que engloba tanto a demanda contratada quanto a energia consumida, já que o valor total da operação inclui os dois. “O consumidor não está pagando apenas pela energia oferecida, mas também remunera a companhia elétrica pela garantia de receber uma cota mínima de energia, que lhe permite programar e operar seu empreendimento”, diz o estado em seu recurso.
Os argumentos da empresa não foram acolhidos pelo relator, o ministro Edson Fachin. Em seu voto, o ministro cita a jurisprudência consolidada do STJ, no sentido de que “a disponibilização de potência elétrica gera custos à concessionária, e por isso deve ser integralmente paga. No entanto, não corresponde ao consumo de energia elétrica, que é o que efetivamente foi utilizado com a ligação de equipamentos e máquinas, podendo ser maior ou menor do que o que foi disponibilizado”.
Tema sumulado
A demanda contratada é a disponibilização de potência do sistema de energia, um instrumento geralmente utilizado por grandes indústrias e empresas, que precisam de uma alta quantidade de energia para ligar várias máquinas ao mesmo tempo, por exemplo. Assim, a empresa contrata certa quantidade de energia, mas nem sempre utiliza toda a demanda contratada.
Neste contexto, criou-se uma discussão na Justiça. De um lado, os fiscos estaduais, a quem compete cobrar o ICMS, entendem que o imposto deve incidir sobre toda a energia elétrica contratada. Por outro lado, contribuintes entendem que o ICMS deveria incidir apenas sobre a energia efetivamente utilizada.
Em 2009, o STJ editou a Súmula 391, fixando que “o ICMS incide sobre o valor da tarifa de energia elétrica correspondente à demanda de potência efetivamente utilizada”. Mas o STF ainda não havia se pronunciado sobre o tema.
Em seu voto, Fachin reitera o entendimento do STJ e diz que o consumo de energia não se depreende da disponibilização da potência, e sim de seu efetivo uso. “Chega-se, portanto, agora sob a ótica constitucional, à conclusão de que a demanda de potência elétrica não é passível, per se, de tributação via ICMS, a despeito de sua legítima cobrança tarifária pela prestação de serviço de energia elétrica. Isso porque não se depreende o consumo de energia somente pela disponibilização de demanda de potência ativa. Na espécie, há clara distinção entre a política tarifária do setor elétrico e a delimitação da regra-matriz do imposto em comento”, diz Fachin.
Por isso, entende que o acórdão do TJSC “não destoa da atual ordem constitucional, porquanto o imposto deve ser calculado sobre o preço da operação final entre fornecedor e consumidor, não integrando a base de cálculo eventual montante relativo à negócio jurídico consistente na mera disponibilização de demanda de potência não utilizada”.
O relator foi acompanhado pelos ministros Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Celso de Mello, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso. Assim, por maioria, foi negado provimento ao recurso extraordinário. Os ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio Mello divergiram.