Mesmo depois do STF (Supremo Tribunal Federal) ter acatado a revisão da vida toda, muitos juízes país afora ainda relutam em reconhecê-la de forma temporária ou definitiva.
Se o Judiciário fosse comparado ao desenho de uma pirâmide, o Supremo ocuparia a ponta mais alta seguido das demais instâncias. E cada juiz que compõe essa estrutura dispõe de liberdade de pensamento, inclusive para discordar da decisão dos ministros de Brasília.
Quando isso ocorre, há o risco de o aposentado perder a revisão ou gastar mais tempo na escalada até o topo e reformar o entendimento dos juízes do andar debaixo. É justamente isso que vem acontecendo em alguns casos de aposentados que ainda não conseguiram ter acesso à revisão. E vários são os motivos para justificar essa dificuldade.
Quem tinha esperança de que o seu processo fosse resolvido num passe de mágica – após o julgamento do STF – pode se frustrar, principalmente se o juiz responsável pelo caso não se perfila ao entendimento do Supremo.
A primeira dificuldade pode ocorrer em razão de um instituto chamado ‘sobrestamento’, espécie de paralisação temporária que atingiu milhares de processos em todo o país até que o tema fosse julgado.
Com a decisão em dezembro, praticamente é nula a chance de o INSS consiga uma reviravolta, acaso insista em recorrer. Mesmo com pouquíssima chance de reversibilidade, alguns juízes estão argumentando que o processo não finalizou e, por isso, permanece o sobrestamento. Possivelmente o INSS irá recorrer, mas isso não deve ameaçar o que ficou decidido.
Cabe salientar que, quando o mesmo STF em 2016 negou o direito à desaposentação no Brasil, vários juízes se anteciparam em arquivar automaticamente milhares de processos sobrestados, ainda que naquela ocasião não estivesse exaurido todos os recursos supervenientes ao julgamento mais importante. Com a revisão da vida toda, há melindre por parte de alguns juízes em liberarem sua aplicação em favor dos aposentados.
Outro ponto que tem gerado problema é quando o aposentado pede judicialmente a tutela de urgência, isto é, o requerimento ao juiz de antecipar a revisão para que a aposentadoria aumento de imediato sem esperar a conclusão do processo. A legislação autoriza que este pedido seja mais rápido, quando as alegações de fato puderem ser comprovadas documentalmente e existir tese firmada em julgamento de casos repetitivos, como foi o caso da revisão da vida toda.
Com as diretrizes firmadas pela Corte Constitucional, o direito à revisão da vida toda passa a ter caráter incontestável a ser reconhecido nas ações judiciais. O Tema 1102 do STF passa a ter caráter vinculante, para assegurar ao segurado optar pela regra definitiva, caso tenha implementado seus requisitos.
Mas alguns magistrados têm negado a antecipação do aumento salarial argumentando que somente será possível confirmar se a regra permanente é, de fato, mais favorável ao segurado somente quando o INSS apresentar a defesa, o que pode demorar meses. Há também argumentações de que a revisão da vida toda só pode ser librada para aumentar a aposentadoria imediatamente tão logo o STF publique o acórdão do julgamento do Tema 1102 e transcorra o prazo do Instituto apresentar algum recurso.
Na verdade, nem todo juiz é muito simpático à tese da revisão da vida toda. Nestes casos, todo argumento é válido para não dificultar o direito, mesmo o STF tendo reconhecido sua viabilidade. O aposentado deve ficar atento para acompanhar essas dificuldades, a fim de poder receber sua revisão mais rapidamente. Quando algum juiz se recusa a acatar o que foi decidido pelo STF, há um recurso chamado reclamação, espécie de ‘dedo-duro", usado para garantir a autoridade das decisões do Supremo. É uma outra forma de tentar agilizar que a revisão da vida toda seja concretizada o mais rápido possível.
Rômulo Saraiva é advogado especialista em Previdência Social, é professor, autor do livro Fraude nos Fundos de Pensão e mestre em Direito Previdenciário pela PUC-SP.