O governo decidiu criar um limite de 8% ao mês às taxas de juros cobradas pelos bancos caso o cliente precise usar o chamado cheque especial. A resolução, aprovada pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), também liberou a cobrança de uma tarifa sobre o produto.
O cheque especial é o nome dado ao crédito liberado pelo banco caso o cliente necessite efetuar pagamentos ou transferências e sua conta não tenha saldo suficiente.
De acordo com os técnicos do BC (Banco Central), hoje os juros médios do crédito especial são de 306% ao ano. Ao mês, o percentual fica por volta de 12%.
"Optamos por [estabelecer] um limite de 8% ao mês, o que significa uma taxa anualizada de 150%”, disse João Manoel Pinho de Mello, diretor de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução do BC. "A concorrência não funciona a contento no produto do cheque especial. O objetivo é reduzir o custo do produto e fazer essa redução ser passada ao consumidor", completou.
Por outro lado, a resolução libera os bancos a cobrarem uma tarifa de 0,25% sobre o limite total de cheque especial para o cliente que tiver o produto disponível para uso. O valor é descontado dos juros de cheque especial caso o cliente use o produto.
Quem tem limite de até R$ 500 ficará isento da tarifa. De acordo com o BC, 19 milhões de clientes se encaixam nessa isenção, de um universo total de 80 milhões de usuários de cheque especial.
A isenção para a faixa de limite de até R$ 500 é estendida a todos os clientes (ou seja, quem tem um limite de R$ 600 paga a tarifa apenas sobre R$ 100 restantes).
Apesar do discurso liberal da equipe econômica, o BC acabou estabelecendo um teto para a cobrança dos bancos no cheque especial.
"Importante destacar que a experiência internacional mostra que a definição de limites de taxa de juros e a cobrança de tarifas para linhas emergenciais estão presentes em regulamentação de economias avançadas e emergentes", diz a autoridade monetária, em nota.
De acordo com o BC, a medida corrige uma falha de mercado no cheque especial para reduzir seu custo e sua regressividade (ou seja, o custo maior em termos proporcionais para os mais pobres). Outra meta é racionalizar seu uso pelo cliente.
Segundo os técnicos, hoje os principais usuários do cheque especial são clientes de menor poder aquisitivo e menor educação financeira. O BC afirma que os mais pobres usam 45% do limite do cheque especial quando precisam, enquanto mais ricos usam apenas 30%.
A medida ainda obriga bancos a pedirem aval dos clientes para ampliar o limite do cheque especial. Hoje, instituições costumam alterar esses valores sem pedir autorização.
A limitação dos juros entra em vigor em 6 de janeiro de 2020. Os contratos firmados a partir dessa data também poderão incluir a cobrança da tarifa.
Para contratos em vigor, a incidência de tarifa só será permitida a partir de 1º de junho de 2020 (caso não venham a ser repactuados antes, cabendo à instituição financeira comunicar ao cliente a sua incidência com 30 dias de antecedência).
Os técnicos foram perguntados sobre qual o impacto da medida para as receitas dos bancos (se positiva, negativa ou neutra). Os técnicos responderam que não é possível saber. "Não conseguimos dizer isso hoje. É muito difícil precisar esse valor", disse Mello.
Mesmo assim, indicaram que a medida foi tratada com os bancos para ser modelada. O diretor de Regulação do BC, Otavio Damaso, afirmou que há um contato permanente com as instituições financeiras, mas ressaltou que a decisão sobre a regulação cabe ao governo.
Segundo Damaso, para a definição do percentual de juros e de tarifa a ser cobrado dos clientes foram consideradas variáveis como a evolução histórica da taxa de juros da modalidade. "Olhamos todos os estudos, as análises, como se comportou a taxa de juros, os pontos máximos e pontos mínimos, e a gente achou que [esses] eram os parâmetros adequados", afirmou.
O CMN também aprovou resolução que incluiu o cheque especial no rol de produtos abrangidos pela portabilidade de crédito. A medida também permite que operações contratadas originalmente fora do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) sejam enquadradas no SFH (desde que atendida uma série de requisitos). Essas mudanças entram em vigor em abril de 2020.