O governo decidiu flexibilizar no último mês normas para a prestação de contas de igrejas em um aceno à bancada evangélica. As medidas foram tomadas após reclamações feitas por pastores ao presidente Jair Bolsonaro, a Paulo Guedes (ao ministro da Economia) e a Marcos Cintra (secretário especial da Receita Federal).
Eles reclamaram sobretudo da burocracia ligada à prestação de contas da atividade. Depois disso, em junho, duas normas foram publicadas no Diário Oficial da União para flexibilizar as obrigações.
A primeira estabeleceu que organizações religiosas que arrecadem menos de R$ 4,8 milhões sejam dispensadas de apresentar Escrituração Contábil Digital (ECD), um sistema de envio de dados à Receita (como números do balanço, por exemplo). Antes, esse teto era de R$ 1,2 milhão.
Outra norma dispensou de CNPJ os estabelecimentos de organizações religiosas que não tenham autonomia administrativa ou que não sejam gestores de orçamento.
Representantes do Ministério da Economia e da Receita Federal negam que as normas estejam ligadas a apoio no Congresso. Segundo eles, as medidas representariam apenas uma de várias ações sendo tomadas para flexibilizar e simplificar o sistema tributário brasileiro.
De qualquer forma, é a segunda vez neste ano que a Receita Federal sofre pressões em medidas ligadas a igrejas. Em abril, Bolsonaro divulgou um vídeo em que desautorizou Cintra a incluir igrejas na cobrança de um novo tributo.
Em uma mensagem de 41 segundos, Bolsonaro disse que nenhum imposto será criado em sem governo, principalmente um que recaia sobre as igrejas. "Quero me dirigir a todos vocês, dizendo que essa declaração não procede", afirmou o presidente.
Cintra havia mencionado a cobrança em entrevista à Folha. "A base da CP [contribuição previdenciária] é universal, todo o mundo vai pagar esse imposto, igreja, a economia informal, até o contrabando", afirmou Cintra.
Na reforma tributária que Cintra está elaborando, o novo tributo sobre pagamentos (semelhante à antiga CPMF, mas mais ampla por ser aplicada também a transações em espécie) substituiria a contribuição previdenciária sobre os salários, que drena R$ 350 bilhões por ano de empresas e trabalhadores. A fala incomodou líderes evangélicos, que rapidamente telefonaram para Bolsonaro pedindo explicações.
Os evangélicos representam um dos principais grupos de apoio de Bolsonaro, de acordo com a pesquisa Datafolha publicada nesta semana. Dentre aqueles que dizer ter essa religião, 41% aprovam o governo do militar reformado. Ante 30% dos católicos e 25% dos sem religião.