O Ministério da Economia articula com o Congresso medida para destravar a criação de uma espécie de cadastro do “bom devedor”. O objetivo é identificar empresas e pessoas que devem à União, mas respeitam procedimentos e seguem o rito de cobrança, não escondem patrimônio nem omitem informações.
Contribuintes com nota elevada no Cadastro Fiscal Positivo, o que indica baixo risco de calote, terão benefícios. Poderão, por exemplo, ter condições mais favoráveis para regularizar os débitos e oferecer garantias mais baratas enquanto discutem as dívidas.
A ideia é incluir as diretrizes em um projeto que já tramita no Congresso e traz o conceito de devedor contumaz. O texto, apresentado pelo governo com a reforma da Previdência, passaria a ter detalhamento maior dos tipos de devedores, com parâmetros para que sejam dadas notas de classificação a depender do nível de risco envolvido.
“A nossa ideia é dar o tratamento adequado ao contribuinte de acordo com o perfil dele”, disse à Folha o Procurador-Geral Adjunto de Gestão da Dívida Ativa da União, Cristiano Neuenschwander.
A PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) fez uma consulta pública sobre o tema em 2018 e agora prepara uma minuta do programa. Após a aprovação do projeto no Congresso, seria editada uma portaria para regulamentar seu funcionamento.
Com o programa, os contribuintes classificados com pequeno grau de risco e histórico positivo terão tratamento diferenciado, tanto nos serviços de atendimento, quanto nos procedimentos de cobrança e condições para regularização do débito.
Na avaliação da PGFN, a medida criaria um incentivo à regularização dos débitos. Na análise, seria observado se o contribuinte responde às intimações, segue as regras, paga débitos quando perde uma disputa e cumpre acordos de parcelamentos de débitos.
Em situações de execução judicial aberta pela União para cobrar uma dívida, o contribuinte que deseja discutir precisa oferecer uma garantia no valor integral do débito.
O governo usualmente pede garantias que têm alto custo, como depósito judicial, seguro ou fiança bancária.
Devedores no cadastro positivo seriam autorizados a oferecer garantias menos onerosas, como imóvel próprio ou fiança oferecida por empresa do mesmo grupo, sem necessidade da contratação de um banco.
Em sentido contrário, contribuintes de risco elevado (devedores contumazes) passariam por procedimentos de cobrança mais rigorosos.
A nota também poderá pesar na decisão de registrar o devedor em órgãos de proteção de crédito ou na avaliação sobre a modalidade de cobrança a ser adotada.
O programa vem sendo discutido com o relator do projeto de combate ao devedor contumaz e fortalecimento da cobrança da dívida ativa, deputado Arthur Maia (DEM-BA).
A equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) incluiu a proposta na reforma da Previdência como forma de neutralizar o discurso da oposição de que, antes de endurecer as regras de aposentadoria, deve-se cobrar as dívidas.
Maia prevê que o projeto seja votado em comissão da Câmara até começo de novembro. Antes disso, apresentará o relatório com alterações.
Ele informou que deve criar um mecanismo que permite abater precatórios (dinheiro que uma empresa ou pessoa física tem a receber da União) na hora de pagar a dívida.
“Já que o governo exige que a pessoa física ou jurídica não seja um devedor contumaz, o governo não pode ficar devendo também. Queremos um modelo de compensação com precatórios”, afirma Maia.
Para Neuenschwander, a ideia faz sentido e deve ser estudada a possibilidade de incluir o dispositivo no texto que tramita no Congresso.
“Contabilmente, vai ficar transparente. Aparece a despesa [com o precatório] e vai gerar uma receita equivalente [com a dívida quitada]. É um mecanismo interessante. Muito pior seria a União pagar o precatório e o contribuinte continuar devendo.”