Com o veto de Jair Bolsonaro à criação de um imposto similar à CPMF, base da reforma tributária do governo para reduzir os encargos na folha de pagamento das empresas, o ministro Paulo Guedes (Economia) criou um grupo de trabalho para entregar, em sessenta dias, uma nova proposta ao Congresso.
A pessoas próximas, Guedes chama a iniciativa de reforma tributária fásica.
A ideia é fatiar a reforma em três etapas. A primeira fase faria a simplificação e unificação de impostos federais, criando instrumentos para a adesão dos estados por meio do chamado IVA dual.
Numa segunda etapa, o governo enviaria ao Congresso a reforma do IR (Imposto de Renda), que incluiria correção da tabela, tributação de lucros e dividendos e menos tributos para empresas.
A desoneração da folha, uma bandeira do próprio Guedes, ficaria para a terceira fase, pois é preciso ver alternativas para compensar as perdas de arrecadação após o veto do presidente à nova CPMF, como passou a ser chamado o imposto sobre transações que foi defendido pelo ex-secretário da Receita Federal Marcos Cintra e levou, inclusive, a sua demissão.
O governo já tinha estabelecido que a reforma teria três eixos, mas a iniciativa de apresentar pacotes de medidas em etapas diferentes ganhou força diante de pressões políticas.
A reforma tributária é considerada, de longe, a mais complicada, por envolver diferentes entes da federação e também atrair a atenção do setor privado. Fatiá-la é um caminho para focar discussões e agilizar as negociações.
Opção semelhante foi adotada pelo ex-presidente Michel Temer. Quando passou a sofrer dificuldades para articular com o Congresso em torno de uma reforma mais profunda, Temer também decidiu se concentrar na simplificação de tributos federais.
As discussões em torno da proposta, no entanto, estenderam-se ao longo do governo Temer sem uma conclusão.
A nova CPMF era um ponto central da proposta de Guedes para desonerar a folha de salários das empresas e ainda promover ajustes no imposto de renda. Na equipe econômica, há dúvidas sobre qual será o caminho da reforma tributária sem o imposto sobre pagamentos.
Um integrante da equipe econômica já chegou a afirmar que, se ninguém quiser a CPMF, não será possível prosseguir no plano original. Pessoas próximas à proposta inicial do ministro dizem que nem haverá uma reforma tributária de fato, apenas ajustes no sistema atual.
O próprio Guedes admitiu, em evento na semana passada, não haver clima para a criação do imposto sobre transações financeiras.
“Nós vamos deixar aquela pergunta, aquele ponto de interrogação. Proponham os senhores uma alternativa para desonerar a folha”, afirmou na quinta-feira (10) em um evento direcionado a investidores.
Guedes estimava arrecadar R$ 150 bilhões com o novo imposto e, assim, esperava bancar a desoneração de outros impostos. Agora, o ministro pretende dar apenas “os primeiros passos” na reforma tributária após a aprovação da reforma da Previdência.
Pessoas próximas ao ministro afirmam que diante do revés, ele preferiu centrar fogo na reforma administrativa e na reforma do Orçamento (chamada por ele de pacto federativo).
A reforma tributária será conduzida por um grupo de trabalho criado de tal forma para agilizar o envio da proposta ao Congresso. Isso porque, segundo integrantes, já conta com participantes da área jurídica da União.
É esse grupo que deverá trabalhar no fatiamento da reforma em etapas, começando pelo projeto de lei que unificará PIS e Cofins em um único tributo sobre bens e serviços, um IVA.
Na proposta original, a alíquota desse imposto seria de 11%. Agora, no entanto, é estudado mais de um percentual.
O consumo pode ter uma cobrança extra para atender interesses de setores que temem uma cobrança excessiva. Entre os mais afetados estão empresas de saúde, educação, segurança e aviação.
A fusão do PIS e Cofins vai servir de teste para que o governo analise a inclusão, posteriormente, de outros tributos federais. São alvo de estudos para essa união o IPI, cobrado das indústrias e importadoras, e o IOF, cobrado sobre todas as operações financeiras.
As discussões serão comandadas pela advogada Vanessa Canado, que integrava o time do economista Bernard Appy. Ele foi responsável pelo texto da reforma tributária que hoje tramita na Câmara e é de
No governo, Canado será diretora na Assessoria Especial de Relações Institucionais do Ministério da Economia. Ela já vinha participando nos últimos meses, assim como outros especialistas, de reuniões na pasta para discutir a reforma tributária em execução pelo governo.
Com diferentes trabalhos publicados sobre o tema, em especial sobre PIS e Cofins, ela se destacou nas reuniões e chegou a ser cotada para secretária especial da Receita Federal no lugar de Marcos Cintra.
Nos bastidores, o entendimento é que seria necessário alguém que conhecesse de forma profunda a Receita para lidar com os diferentes grupos de interesse no órgão. Por isso, Guedes acabou definindo um servidor de carreira para o posto, José Barroso Tostes Neto.
Enquanto isso, Canado vai comandar as discussões sobre a reforma. Também integra o time das discussões o professor Aloísio Araújo, da FGV (Fundação Getulio Vargas).
Em paralelo à reforma do governo, estão em análise no Congresso propostas de reforma tributária da Câmara e do Senado. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem dito publicamente que já não haveria tempo hábil para iniciar a tramitação de nenhuma delas ainda em 2019, e que o tema só será analisado em 2020.