A tutela de urgência pode ser concedida em qualquer fase da ação acidentária, desde que estejam presentes os requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil (CPC) — probabilidade do direito e perigo de dano. E especialmente quando há excessiva demora na marcação da perícia e a necessidade de garantir a manutenção do segurado, pelo cancelamento abrupto de pagamento de benefício de caráter definitivo.
Nesta linha de entendimento, o desembargador Tasso Caubi Soares Delabary, da 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), reformou despacho que negou a antecipação de tutela a um segurado que teve suspensa a sua aposentadoria por invalidez há mais de dois anos — ele a recebia há dez anos da Previdência Social.
Com a decisão do desembargador, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tem de restabelecer o benefício em dez dias, sob pena de pagamento de multa diária, até que sobrevenha decisão judicial nos autos da ação originária, que tramita na Comarca de Dois Irmãos.
Segundo o relator do agravo de instrumento, a incapacidade laboral da parte agravante foi demonstrada por documentos médicos, datados de janeiro deste ano, inclusive, que expressam a impossibilidade da volta ao trabalho. E estes documentos foram confeccionados por médicos sob os quais não paira nenhuma indicação desabonadora que possa abalar o crédito de suas conclusões.
Coisa julgada
Além disso, Delabary frisou que o autor teve reconhecido o direito à aposentadoria por invalidez anteriormente, de forma judicial, formando coisa julgada. Neste quadro, entendeu ser inviável simplesmente cessar o pagamento do benefício com base em perícia realizada administrativamente, sem demonstrar à Justiça a modificação da condição de saúde do segurado.
"Assim como ocorrido, verifico que a deliberação administrativa para cessação do benefício importa violação ao princípio do paralelismo das formas, mormente no caso da concessão do benefício de aposentadoria por invalidez que, em princípio, tem caráter de benefício definitivo e que foi resultante de decisão judicial, de sorte que o seu cancelamento somente é possível através de decisão de mesma natureza; ou seja, pela via judicial, à luz do preconizado no art. 505, do CPC", concluiu na decisão, proferida no dia 1º de setembro.
Incapacidade total para o trabalho
Segundo os autos, o segurado sofreu acidente de trabalho em 2002, que resultou em grave traumatismo craniano, passando a receber o benefício de auxílio-doença do INSS. Em função do agravamento das condições de saúde, o autor conseguiu provar, na via judicial, total incapacidade para voltar ao trabalho, transformando o seu auxílio-doença em aposentadoria por invalidez em agosto de 2008.
Decorridos quase dez anos, a autarquia previdenciária convocou o segurado para uma "avaliação periódica", como autoriza os artigos 60 e 101 dos Planos de Benefícios da Previdência Social (Lei Lei 8.213/9). O objetivo destas convocações é verificar se ainda persiste, no segurado, a incapacidade para o trabalho. Quando entende que não persiste, a autarquia previdenciária cessa o pagamento do benefício que está sendo alcançado ao segurado.
Mediante simples exame clínico, sem considerar o histórico da doença neurológica que resultou na incapacidade laboral, o INSS suspendeu o pagamento da aposentadoria por invalidez. O segurado, então, voltou à Justiça, desta vez para pedir o pronto restabelecimento do benefício, requerendo a antecipação de tutela à Vara Judicial da Comarca de Dois Irmãos.
Liminar negada
Em despacho proferido no dia 18 de setembro de 2018, a juíza Larissa de Moraes Morais, negou a antecipação de tutela. Argumentou que somente poderia formar um "juízo de convicção" a partir de documentos trazidos pela parte autora. Assim, ela reservou a apreciação do pedido de antecipação de tutela para depois da entrega do laudo pericial — mediante provocação da parte interessada — e com urgência.
A julgadora deu prazo de 15 dias para as partes arguirem eventual impedimento ou suspeição, indicarem assistente técnico e/ou apresentarem quesitos ao processo. "Nessa senda, determino, desde logo, que as perícias nas áreas da neurologia e da psicologia sejam executadas pelo DMJ [Departamento Médico Judiciário]. Com a data dos exames periciais, intimem-se as partes. Realizadas as perícias, os laudos deverão ser entregues a este Juízo no prazo máximo de 30 dias", registrou o despacho.
Em combate a esta decisão, a defesa do segurado interpôs recurso de agravo de instrumento no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que acabou provido em caráter monocrático quase dois anos depois.