Pode ser difícil desapegar de um negócio mesmo quando ele vai mal. Mas saber a hora de fechar as portas é fundamental para não se afundar em dívidas.
A decisão envolve um pouco de futurologia, afinal, é preciso analisar métricas da empresa e tentar prever problemas.
“Se os dados demonstram e os fatos comprovam que a situação é irreversível, é necessário tomar a decisão mais difícil: encerrar a empresa”, afirma Peterson Coli, diretor-executivo do Grupo Ideale, de treinamento e assessoria a empresas.
De acordo com Coli, conhecer o presente e estudar o futuro é a base de tudo.
A dica é parar e pensar: “Onde estarei daqui a cinco ou dez anos?”. “Esse exercício de você antecipar, de enxergar o futuro, estar antenado com o seu mercado, faz com que você permaneça, inove ou simplesmente perceba que deve mudar de ramo”, diz o consultor.
A empresária Juliana Buzzini, 40, conseguiu prever seu fracasso a tempo de mudar de rota. Formada em veterinária, ela herdou do pai parte de um negócio que juntava locadora de vídeos com pizzaria no bairro de Perdizes, zona oeste de São Paulo.
Como ganhava mais dinheiro com o comércio, deixou a clínica de lado e manteve o negócio por 20 anos.
Com o passar do tempo, o mercado de locação de VHS e DVDs se tornou obsoleto. Ao mesmo tempo, ela percebeu que a relação com a sócia estava desgastada e decidiu fechar a empresa em 2016.
“Eu queria ter encerrado até antes, mas tinha apego emocional e segui mais um pouco, até que pensei: quer saber? Não é o que eu amo, nunca foi. Resolvi ser feliz e praticar terapias alternativas, algo que sempre me acompanhou na vida como hobby.”
Juliana se aprofundou na psicanálise e, em poucos meses, abriu outro negócio. As coisas evoluíram até a abertura, há dois anos, do Espaço Cura, onde, segundo ela, ganha menos que nos tempos de pizzaria, mas tem mais realização pessoal.
Não insistir no que está dando errado. Essa foi a lição que quatro falências deram ao chef boliviano Winston “Checho” Gonzales, 53.
Desde 1973 no Brasil, Checho venceu pelo cansaço até chegar ao sucesso com a Comedoria Gonzales, no Mercado de Pinheiros, e com o Mescla, na Barra Funda, ambos em São Paulo.
Segundo o chef, a primeira falência (um bar nos anos 1990) serviu para ele se concentrar no que gostava: cozinhar. Em 2004, Checho foi para Macaé (RJ), fazer gastronomia requintada para executivos e funcionários da Petrobras. “Queria mostrar uma cozinha de vanguarda, e o povo queria comer bife com batata frita. Errei o perfil do público. Durou um ano.”
Depois de temporadas na Espanha e em São Paulo, Checho foi tentar mais um empreendimento no Rio, e insistiu na cozinha autoral de vanguarda. O restaurante se chamava Pecado e, para piorar, ele abriu uma filial em Trancoso. Em pouco mais de seis meses, os dois restaurantes faliram.
Quebrado, voltou a trabalhar como empregado e foi para São Paulo montar um restaurante nos Jardins chamado Ají, em 2010.
“Errei novamente o público. Era para ser um lugar mais simples, com custo menor, preço mais baixo. Quebrei forte por apostar em luxo”, conta.
A lição foi definitiva. A solução foi recomeçar por baixo, apostando na simplicidade. O chef passou a vender comida em barraquinhas nas portas de algumas casas noturnas paulistanas. “Na hora que eu desci do salto alto, as coisas começaram a virar.”
Foi quando, ao lado do chef popstar Henrique Fogaça, montou O Mercado, uma feira gastronômica com comidas de rua. O sucesso foi tanto que Checho juntou dinheiro para abrir, há cinco anos, a Comedoria Gonzales.
A prosperidade o levou a inaugurar neste ano o Mescla. “Depois que eu tomei a rédea dos negócios, a coisa melhorou”, diz Checho, que hoje divide a gestão da empresa com seu pai, um ex-tipógrafo.
E, mesmo com o sucesso, as dificuldades seguem por conta de algumas burocracias e instabilidades econômicas.
Neste fim de ano, o chef vai fazer um financiamento para pagar o 13º salário dos seus 16 funcionários porque quase todo o fluxo de caixa está preso nos cartões de crédito.
Checho demorou para descobrir seu público e acabou cometendo um dos erros clássicos do empreendedorismo: deixar de identificar sinais de que o negócio não vai bem.
“Para boa parte desses sinais há solução e, muitas vezes, ela está dentro de casa. É fundamental continuar estudando e aprendendo todos os dias como superar os obstáculos. Ficar atento às oportunidades e saber aproveitá-las é fundamental. Perceber as ameaças é de igual importância”, diz Peterson Coli.
“Muitas vezes o mercado muda, o produto é superado pela concorrência e pela tecnologia, o time não consegue atingir o nível de produtividade para enfrentar as margens cada vez mais apertadas e os custos”, afirma o consultor.