A iniciativa da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) de pedir indenização a prefeituras e estados por perdas sofridas com as medidas de isolamento está ganhando adesão de outros segmentos de comércio e serviços. Há cerca de dez dias, a entidade começou a ingressar com ações civis públicas em 26 estados, Distrito Federal e 275 municípios buscando reparação do poder público pelos prejuízos com as restrições impostas para enfrentamento da pandemia.
Para especialistas, é difícil que a Justiça acate o pedido, já que as ações visaram conter a disseminação da Covid-19, mas, caso haja alguma decisão favorável, o movimento deve ganhar força de mais setores.
A Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce) disse que também analisa a possibilidade de entrar na Justiça contra estados e municípios. Segundo eles, o setor já perdeu R$ 90 bilhões em vendas, 110 mil empregos e 12 mil lojas fecharam.
“A Abrasce considera possível equilibrar saúde e economia. O abre e fecha do comércio gera inseguranças, e os shoppings, mesmo sem operar, continuam pagando impostos como IPTU e ICMS”, disse a entidade em nota.
Acordos tributários
A medida da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes é vista mais como uma pressão para promover acordos e renegociações de dívidas tributárias do que de fato conseguir algum ressarcimento financeiro.
— Estamos aberto para acordos e negociações coletivas, como perdoar dívidas de impostos atrasados. Já há governadores e prefeitos conversando conosco para acordos — reconhece o presidente da Abrasel, Paulo Solmucci.
George Pinheiro, presidente da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB), que tem mais de dois milhões de empresas associadas, afirma que a entidade também tem interesse em entrar com ação, mas ainda avalia se seria junto da Abrasel ou isoladamente.
Dependente da circulação de pessoas, o setor de bares e restaurantes foi um dos mais atingidos com as restrições para conter a Covid. Desde o início da pandemia, mais de 335 mil estabelecimentos fecharam as portas para sempre, causando mais de 1,3 milhão de demissões, segundo a associação.
Solmucci pontua que as ações propostas contra estados e municípios não questionam as decisões em prol da saúde pública, mas o estrago feito nos caixas e como as medidas foram tomadas:
— Independentemente da razão, a perda aconteceu e foi imposta pelo estado. Algumas ações foram tomadas sem nenhum estudo especifico. Por que fechar bares e abrir supermercados e deixar ônibus lotados?
Ele explica que, caso algum dos tribunais acate a decisão de direto ao ressarcimento, cada associado deve entrar em contato com a prefeitura e estado para fazer a solicitação.
Para o advogado José Arnaldo da Fonseca Filho, especialista em Direito Público e sócio do Godke Advogados, este tipo de ação tem pouca chance de vingar. Ele acredita que a Justiça deve considerar o estado da pandemia e entender que o fechamento do comércio foi necessário para garantir a saúde das pessoas.
— Mesmo que a decisão da Justiça não seja favorável à Abrasel, a medida vai causar algum barulho, e outros setores, como academias e salões, que também ficaram fechados, podem tomar a mesma iniciativa — comentou Fonseca Filho.
Medidas insuficientes
Durante a pandemia, o empresário Raphael Gonçalves fechou um bar em Botafogo, na Zona Sul do Rio, e viu o faturamento de seu segundo estabelecimento, o Botequim Rio Antigo, em Olaria, na Zona Norte, cair 80%.
Ele aderiu aos acordos de redução e suspensão de jornada e salário, assim como ao empréstimo do Pronampe, mas, como outros pequenos comerciantes, afirma que as medidas não foram suficientes.
Gonçalves apoia a decisão da Abrasel, pois considera que, apesar das proporções da pandemia, o estado tomou decisões ruins:
— Vários bares aqui ao redor estavam abertos, não tinha fiscalização, o que nos prejudicou como concorrência. Fora o atraso das vacinas. As decisões do que podia funcionar e os horários também foram questionáveis. A prefeitura liberou as praias e não os bares. Eles foram negligentes.
A prefeitura do Rio diz que as fiscalizações são realizadas em toda a cidade por meio de rondas e denúncias. Sobre o processo da Abrasel, o governo municipal informou que ainda não foi notificado da ação e, só após ser informado oficialmente, poderá avaliar a elaboração de eventual impugnação.
A prefeitura enfatizou, ainda, que todas as decisões nos decretos municipais tomam como base a situação epidemiológica da cidade, acompanhada diariamente por uma equipe de técnicos da saúde.