Um processo em análise pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a respeito das regras do auxílio-doença pode resultar em um impacto de R$ 86,9 bilhões em 30 anos para o INSS e anular uma parcela da economia prevista com a reforma da Previdência. Está em julgamento pela Corte a tese de que trabalhadores possam contar o tempo no qual receberam o auxílio para fins de carência no pedido de outros benefícios, como aposentadoria.
Na prática, a medida pressiona o déficit da Previdência porque permite ao trabalhador contabilizar o período de afastamento como tempo de contribuição efetiva. De acordo com cálculos da Secretaria de Previdência, o aumento da despesa seria de R$ 19,9 bilhões em dez anos e de R$ 48,8 bilhões em 20 anos, chegando a R$ 86,9 bilhões em 30 anos.
Cinco votos a favor
A decisão do STF tem repercussão geral, ou seja, vai orientar todas as ações contra o INSS em todo o país. Não contaria, no entanto, para benefícios já concedidos.
Atualmente, a Justiça tem decidido a favor dos trabalhadores, desde que o recebimento do auxílio-doença seja intercalado com períodos de contribuição. No entanto, o INSS entrou com recurso no STF para reverter esse movimento, com base na reforma da Previdência, em vigor desde novembro de 2019. Ela proíbe a contagem do chamado tempo ficto, em que não há contribuição efetiva, para a concessão de benefícios.
No recurso, o INSS alega ainda que a Constituição proíbe a concessão de benefícios sem indicação da fonte de custeio. O processo que chegou ao STF se refere a uma ação de uma segurada que solicita aposentadoria por idade. Ela recebeu auxílio-doença entre março de 2003 e junho de 2003 e novamente entre novembro de 2003 e março de 2018.
O julgamento do STF começou em dezembro e deve terminar no dia 18 deste mês. Apesar dos argumentos do governo, cinco ministros já se manifestaram contra a União, alegando que há uma jurisprudência formada no país. São os ministros Luiz Fux, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Dias Toffoli. Faltam ainda seis votos.
A economia projetada com a reforma da Previdência nas contas do INSS é de R$ 621,3 bilhões em dez anos. No caso das aposentadorias por idade, seria de R$ 110,7 bilhões no período, e nas por invalidez, de R$ 78,6 bilhões. Esses dois tipos de benefícios devem ser os mais influenciados pela decisão do Supremo.
Desequilíbrio financeiro
Para o secretário de Previdência, Narlon Gutierre, além de trazer desequilíbrio para a Previdência, a medida pode servir de desestímulo aos trabalhadores:
— Computar períodos em gozo de benefício como tempo de carência, além do relevante impacto negativo para o equilíbrio financeiro e atuarial da Previdência, não se observa a necessidade de equidade na participação no custeio do sistema e a vedação à criação, majoração ou extensão de benefícios sem correspondente fonte de custeio. Do ponto de vista comportamental, cria-se incentivo inadequado para que o segurado permaneça mais tempo em gozo de benefício.
Mesmo com a reforma da Previdência, o regime continua deficitário. Em 2020, o rombo foi de R$ 259 bilhões, cifra que deverá ser superada neste ano e nos seguintes. A expectativa do Tesouro para 2022 é de déficit de 292,5 bilhões, chegando a 4,8 trilhões em 2060. Por isso, especialistas advertem que o regime terá de passar por novas mudanças para se tornar sustentável.