O juízo de qualquer Vara de Família tem competência material para resolver conflitos que envolvam a custódia de animais de estimação adquiridos pelas partes litigantes no curso da união estável. A conclusão é do desembargador Rui Portanova, da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
A decisão monocrática do desembargador, tomada no dia 9 de dezembro, resolveu conflito de competência material e territorial no caso de um ex-casal que litigava pelo direito de conviver com os dois cães.
Competência material
A ‘‘ação de compartilhamento de custódia’’ foi inicialmente distribuída ao juízo da 8ª Vara de Família do Foro Central da comarca de Porto Alegre. Esta, acolhendo preliminar suscitada em contestação pela parte ré, declinou da competência ao juízo suscitante da 1ª Vara de Família do Foro Regional do Alto Petrópolis.
Segundo o juízo suscitado, os pets estão residindo com a ré, razão pela qual a competência para o trâmite da ação de compartilhamento é do foro de seu domicílio.
Recebidos os autos, o juízo suscitante entendeu que o processo não envolve matéria da competência material das Varas de Família, razão pela qual suscitou o conflito de competência junto ao Tribunal de Justiça. Ao analisar o mérito do recurso, o desembargador-relator entendeu que ambos os juízos, suscitante e suscitado, detêm a competência material para processar e julgar o feito originário.
Lacuna legislativa
Em sua decisão, Rui Portanova observou: ‘‘Não há dúvida quanto à existência de lacuna legislativa a tratar da regulamentação da posse de animais de estimação. E essa lacuna torna-se mais evidente quando o debate decorre do término da relação familiar, como é o caso dos autos’’.
Para Portanova, o fato é que os animais foram ‘‘incontroversamente adquiridos’’ pelas partes no curso da união estável. Logo, tratando-se de relação jurídica originada no curso da união estável, o seu debate deve ser travado perante o juízo especializado da Vara de Família.
Competência territorial
Sobre a competência territorial, para definir onde tramitará a ação, ele recorreu ao artigo 46 do Código de Processo Civil (CPC): ‘‘A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu’’. Assim, julgou improcedente o conflito negativo de competência.
A advogada Elisandra Alves Ferreira, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), atua no caso e concorda que a resolução deste tipo de conflito deve ficar com a Vara de Família. ‘‘Acredito ser a decisão mais acertada, pois hoje os casais e as famílias modernas optam por, muitas vezes, não terem filhos e sim animais de estimação. Logo, não deve existir diferenciação quando falamos em custódia dos nossos pets, tendo em vista que estamos falando de uma relação de afeto advinda de uma relação familiar’’, defende Elisandra.
Famílias multiespécies
Ela avalia o tratamento dado às famílias multiespécies no ordenamento jurídico brasileiro: ‘‘Penso que é um assunto novo, mas que merece ser apreciado com o olhar e a sensibilidade dos profissionais e juízes da área de Família. Fato é que a lacuna legislativa e jurídica existe, e a relação de afeto é evidente, portanto, não podemos nos abster em atender essa demanda’’. (Com informações da Assessoria de Imprensa da IBDFAM)