Em meio a impasse sobre o cálculo correto de PIS e Cofins (contribuições federais) que as empresas devem pagar, a Receita Federal emitiu parecer que, segundo tributaristas, deve ampliar a judicialização do assunto.
Em 2017, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que o ICMS, imposto sobre circulação de mercadorias estadual, deve ser desconsiderado na hora de se calcular o valor de PIS e Cofins que as empresas vão recolher para a União —o que leva a redução do valor pago pelas empresas.
A ideia é que o ICMS, por ser imposto, não faz parte do faturamento da companhia e, portanto, não deve ser tributado.
Apesar de ainda haver recurso da União sobre alguns pontos da decisão, ela gerou uma série de ações de empresas com o objetivo de recuperar valores de impostos pagos a mais no passado.
A PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional) diz ter registrados em seu sistema interno quase 12,8 mil processos discutindo o assunto.
Como o principal tema de discussão no Supremo já foi definido pelo STF, empresas vinham obtendo ganho de causa e já passaram a incluir os créditos tributários em seus balanços.
Porém o valor que elas podem recuperar será menor do que o esperado quando se considera a interpretação do Fisco.
Segundo Solução de Consulta Interna publicada na última terça-feira (23), as empresas que tiveram decisões favoráveis nesses casos tem o direito de descontar para cálculo do Pis e da Cofins devidos o valor de ICMS que foi efetivamente recolhido no mês, e não aquele destacado na nota fiscal —as empresas vinham considerando a segunda alternativa.
A diferença pode ser grande. Isso porque o ICMS é o que tributaristas chama de imposto não-cumulativo, no qual aquilo que a empresa paga de tributo na hora em que compra a mercadoria vira crédito para ser descontado quando ela vende o produto.
Como exemplo: se a empresa compra um produto por R$ 100 e, por incidir nele uma alíquota de 18%, paga R$ 18 de ICMS, ganha essa valor em crédito na hora de vendê-lo. Caso o faça por R$ 200, teria de pagar R$ 36, mas tem R$ 18 descontados devido ao crédito acumulado na operação anterior.
Ainda nesse exemplo, a Receita diria que a empresa pode abater R$ 18 da base de cálculo de PIS e Cofins por causa dessa operação, e não R$ 36, como entenderiam as empresas.
A perda das companhias pode ser ainda maior, segundo o tributarista José Eduardo Toledo, do escritório Toledo Advogados.
Isso porque, dependendo do fluxo de entradas e saídas de mercadorias que ela tem, é possível que em alguns meses ela não tenha ICMS nenhum a recolher, por estar com créditos fiscais acumulados. Nessa situação, não poderá descontar imposto algum na hora de calcular o PIS e a Cofins devida, explica.
"O mercado já contava com esse dinheiro, as empresas já faziam compensações e as incluíam em seus balanços. Agora podem ser autuadas por causa disso. Imagina a complicação que isso traz para o empresário."
Segundo Toledo, a situação irá levar mais empresas para a Justiça.
O cenário é especialmente prejudicial para empresas que exportam muito, segundo Marco Behrndt, sócio especialista em direito tributário do Machado Meyer Advogados.
Isso porque, por fazerem muitas vendas em que não incide ICMS, essas empresas tendem a gerar mais créditos tributários do que débitos, explica.
Segundo o especialista, a publicação da Receita não afeta empresas que tiveram decisões favoráveis da Justiça na qual o texto diz claramente que deve-se considerar o valor integral do imposto, não apenas o efetivamente recolhido pela própria empresa. Nesse caso, o direito a exclusão do valor total do cálculo de PIS e Cofins está assegurado.
Porém, caso não haja uma declaração específica, prevalece o entendimento da Receita. "Isso vai gerar instabilidade e criar novos litígios".
Ele lembra que a PGFN (Procuradoria Geral da Fazenda Nacional), discute o tópico em embargos de declaração a serem julgados pelo STF. Caso o tribunal tome decisão em relação ao recurso, o impasse estaria encerrado.