Vencer negociações não depende somente de técnicas de persuasão e bom controle emocional. Para conseguir um acordo favorável aos seus interesses, é preciso ler a linguagem corporal do seu oponente.
Ocorre que compreender o idioma do corpo é muito mais difícil do que parece. Caíram no imaginário popular muitas associações esquemáticas — a ideia de que cruzar os braços significa “se fechar” para o outro, por exemplo — mas nenhuma delas pode ser considerada regra.
“Uma pessoa com os braços cruzados pode simplesmente estar com frio”, afirma Glauco Cavalcanti, professor de negociação do curso de MBA da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Daí a primeira lição básica dos estudiosos de linguagem corporal: a leitura correta de um gesto não pode tomá-lo como um fenômeno isolado. É preciso levar em conta o contexto em que ele aparece.
Não dá para ignorar fatores sutis como a temperatura do recinto, o grau de conforto das cadeiras, a personalidade do indivíduo, seu humor e nível de estresse naquele dia, e por aí vai.
Cavalcanti afirma que também não dá para avaliar posturas fixas ou estáticas. O objetivo não é olhar para a “fotografia”, mas para o “filme” que se passa diante dos seus olhos. “Precisamos acompanhar a evolução dos movimentos da pessoa para criar uma história”, diz o professor. “Só uma sequência de posturas permite arriscar qualquer interpretação”.
Dito isso, é possível estabelecer alguns princípios gerais para compreender a linguagem corporal do outro — e, principalmente, modelar as suas próprias posturas e gestos para atingir determinados objetivos.
A seguir, você verá 10 conselhos do professor da FGV para transmitir autoconfiança, desarmar o seu interlocutor e abri-lo para os seus argumentos durante uma negociação. Confira:
1. Comece com um aperto de mão firme
O processo de negociação já começa nos cumprimentos. Segundo Cavalcanti, o estilo do aperto de mão diz muito sobre a disposição e a hierarquia entre as partes. “O gesto precisa ser firme, com os braços levemente dobrados e olho no olho, para transmitir confiança”, resume o especialista. Também vale sorrir levemente durante o cumprimento, caso se queira criar uma sensação de empatia e proximidade — caso de certas abordagens comerciais, por exemplo.
2. Evite posturas que transmitem fraqueza e submissão
É fundamental evitar posturas que comunicam baixo nível de poder: corpo curvado, ombros caídos, cabeça para baixo e braços cruzados segurando os cotovelos. Às vezes involuntárias, essas posturas dão a entender que você está pouco convencido da probabilidade da sua vitória e, portanto, é uma presa fácil para os avanços do outro.
3. Adote posturas de poder
Queixo erguido, peito estufado, mão na cintura e gestos amplos são alguns sinais físicos de autoridade e poder. Mas o mais surpreendente é que, além de comunicar ao ouvinte que você é uma figura de respeito, essas posições afetam a sua própria disposição psicológica.
De acordo com Amy Cuddy, professora de Harvard, as chamadas “posturas de poder” têm grande influência sobre nossos hormônios: graças a elas, sobe o nível de testosterona e cai o de cortisol. Essa combinação favorece o ataque — e não a defesa — diante de uma ameaça real ou simbólica.
4. Para atacar, adote a "postura de águia"
Seu oponente começou a apresentar seus argumentos. Em negociações mais tensas e competitivas, Cavalcanti sugere adotar a “postura da águia” para ouvi-lo, com cabeça e corpo projetados para a frente. “É uma posição que demonstra atenção, ao mesmo tempo em que exige que o outro lado vá direto ao ponto”, explica.
Também vale identificar os momentos em que o outro inconscientemente se posiciona como "águia" para diagnosticar como ele está se sentindo. “A mão fechada pode revelar que há algum tipo de preocupação”, completa o professor.
5. Para desarmar o outro lado, apoie as costas
O clima está ficando pesado e você quer amenizar a tensão da mesa? A dica é incorporar a “postura do bom ouvinte”, oposta à “postura da águia”. Deixe o corpo arqueado para trás e encoste as costas.
É uma postura mais amigável e aberta ao relacionamento, ideal para momentos em que você precisa desarmar o outro. “Assim você passa equilíbrio, serenidade e paciência, dando tempo para o outro evoluir e falar”, afirma Cavalcanti.
6. Observe se o outro entrou numa postura reflexiva
Quando o individuo adota a postura de “atenção reflexiva”, sua mão costuma ir para o queixo e a expressão facial se torna introspectiva. “A pessoa está analisando a sua proposta, então pense rápido mas fale devagar”, aconselha o professor.
Escolha muito bem as palavras, porque essa é uma hora decisiva para a negociação. Também vale notar a posição do dedo polegar do outro: voltado para cima, reflete uma certa dose de otimismo; virado para baixo, pode indicar pessimismo.
7. Bata a mão na mesa em câmera lenta
Muito bem, chegou a sua hora de falar. A dica do professor da FGV é levar a mão, com a palma voltada para baixo, para a mesa —como se você fosse bater nela em câmera (bem) lenta. Esse gesto chama a atenção do ouvinte e reveste a sua fala de importância.
Ainda sobre as suas mãos: jamais as coloque embaixo da mesa durante a negociação. Isso transmite pouca confiança e dá brecha para que o outro domine a conversa, diz Cavalcanti.
8. Observe a posição da caneta sobre a mesa
Após fotografar milhares de alunos em processo de negociação, o professor Cavalcanti descobriu uma curiosa correlação entre a posição das canetas na mesa e a disposição psicológica dos oponentes.
“Quando estão pouco confiantes, as pessoas tendem a colocar a caneta na posição horizontal, fazendo uma barreira”, descreve ele. “Com o avanço da negociação e aumento de confiança, tendem a colocar a caneta na posição vertical ou tirar o objeto da frente”. Observar esse detalhe sutil ajuda a entender os sentimentos do outro e, se for necessário, adaptar a sua estratégia.
9. Imite gestos e posturas do outro
Outra técnica, bem conhecida, é espelhar a linguagem corporal do seu oponente. Isso cria uma sensação de empatia, acolhimento e proximidade que facilita a concordância com os seus argumentos. "É incrível como a mimetização funciona, como faz você ‘incorporar’ a outra pessoa”, diz Cavalcanti.
Se o outro está de braços cruzados, em claro sinal de desconfiança e hostilidade, experimente fazer o mesmo com os seus braços e, pouco a pouco, descruzá-los. Se tiver conseguido “fisgá-lo” pelo espelhamento, ele também abrirá os braços e se tornará mais receptivo a você. Enquanto não estiver imitando sutilmente as posturas do outro, mantenha uma postura neutra e sempre ereta, com cabeça, tórax, quadril bem alinhados.
10. Tenha uma expressão facial coerente com a sua fala
As expressões faciais compõem um rico e complexo capítulo do estudo da linguagem corporal. Dissecado exaustivamente por gurus como o psicólogo norte-americano Paul Ekman, o assunto não é fácil para leigos. Com uma dificuldade adicional: as microexpressões que atravessam nossos olhos, bocas, queixos e narizes em momentos de tensão, em geral, são involuntárias. O único conselho possível nesse campo, diz Cavalcanti, é buscar o máximo possível de coerência entre o seu semblante e o seu discurso.
Em negociações competitivas, com foco no resultado, é importante manter uma face séria, confiante e até sisuda em alguns casos. Já em conversas mais cooperativas, em que o valor mais importante é o relacionamento, vale intercalar expressões neutras e amigáveis. Nesse caso, o sorriso é muito bem-vindo e pode abrir portas para o acordo final.